domingo, 20 de novembro de 2016

Na selva amazônica colombiana, um homem procura o amor



Arturo Cova é um homem que não se tornou o que poderia ter sido, descendia do infortúnio e o destino implacável lhe retirou a prosperidade, empurrou-o para os pampas. Começa sua estória nos contando que antes nunca foi apaixonado por mulher alguma, “jogou seu coração ao acaso e ganhou a violência”. Nada soube das “delícias embriagadoras, da confidência sentimental”, mas ambicionava “o dom divino de um amor ideal” que incendiaria sua alma e seu corpo como a chama na madeira. E eis que ele conhece Alícia.
“Quando os olhos de Alícia me trouxeram a desventura, havia já renunciado a esperança de sentir um afeto puro. Em vão meus braços – tediosos de liberdade – se estenderam para muitas mulheres, implorando por elas, sucessivamente. Ninguém adivinhava meu sonho. E seguia em silencio meu coração.”
Alícia chegou até ele fugindo de um casamento arranjado por sua família. E amava um primo com quem também não poderia ficar. E se entregou a Arturo facilmente: “se entregou sem vacilações, esperançada no amor que buscava em mim”.  Depois ele continuou querendo-a. Ela lhe respondeu: morrerei sozinha, minha desgraça se opõe a seu porvir. Mesmo assim, fugiu com ele para a floresta amazônica colombiana, para a vida dura dos colonos e indígenas escravizados pela febre da borracha.
Mesmo vivendo dia-a-dia com Alícia, olhava e seduzia as outras mulheres que iam aparecendo pelo caminho, seguindo sua vida de homem de coração endurecido, que compensa em fidalguia o que não pode dar em ternura, com a convicção íntima de que vive como enamorado sem o estar, e de que “essa idiossincrasia cavalheiresca o empurrará até o sacrifício” por uma dama que não é a dele, e por um amor que não conhece.
“A fama de galã ganhou no ânimo de muitas mulheres, graças ao costume de fingir, para que minha alma se sinta menos sozinha. Por toda parte fui buscando no que distrair minha inconformidade, e ia de boa fé, desejoso de renovar minha vida e me resgatar da perversão; porém em qualquer lugar onde pus minha esperança me encontrei lamentavelmente vazio, embelezado pela fantasia e repudiado pelo desencanto. E assim, enganando-me com minha própria verdade, consegui conhecer todas as paixões e sofro o fastio, e sigo desorientado, caricaturando o ideal para sugestionar-me com o pensamento de que estou próximo da redenção. A quimera que persigo é humana, e bem sei que dela partem os caminhos para o triunfo, para o bem-estar e para o amor. Mas se passaram os dias e se foi consumindo minha juventude sem que minha ilusão reconhecesse a derrota; e vivendo entre mulheres sensíveis, não encontrei a sensibilidade, nem entre as enamoradas, o amor, nem a fé entre as crentes. Meu coração é como uma rocha coberta de musgo, donde nunca falta uma lágrima. Hoje me viu chorar, não por fraqueza de ânimo, que bastante rancor o tenho na vida; chorei por minhas aspirações enganadas, por meus sonhos desvanecidos, pelo que não fui, pelo que jamais serei.”

E tudo isso só até a metade do livro. Continuo avidamente a segunda parte, que não pode descumprir a promessa dessa escrita formidável. La Vorágine é a única novela de José Eustasio Rivera e, também, uma obra clássica da literatura colombiana do começo do Século XX. Trouxe também, de minha viagem a Colômbia, em julho, seu livro de poesias Tierra de Promisíon y otros poemas. Em abril de 1928, voltando de Cuba, enviado para um congresso internacional sobre imigração, parou em Nova York, famoso como poeta, novelista, político e diplomata, sentiu-se mal, foi internado e morreu do que pareceu ser uma recidiva de malária.   

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