domingo, 12 de fevereiro de 2012

Whitney Houston

E se foi Whitney Houston, tão linda, tão jovem ainda, tão talentosa. E tão infeliz. Hoje eu tinha acordado mirando de minha janela uma lagoa enorme, tão linda, e o mundo por instantes pareceu-me tão harmônico. Agora a mirada fica envergonhada diante de tamanha infelicidade.


Escuto agora um Cd belíssimo chamado Waiting to Exhale, trilha sonora do filme que ela participou e cantou várias músicas. Se não me engano, o filme em português ficou como "Falando de amor'.
Um trecho da primeira música que abre o CD e que ela canta:

Sometimes you'll laugh/Sometimes you'll cry/Life never tells us, the when's or why's/When you've got friends, to wish you well/You'll find your point when/You will exhale (yeah, yeah, say).


Tradução: Algumas vezes você rirá

Algumas vezes você chorará
A vida nunca conta-nos o quando e o porquê
Quando você tem amigos para desejar-lhe bem
Você encontrará o seu ponto quando
Você vai expirar (yeah, yeah, diga)

Quando o estrangeiro vira inimigo

Outro Emerson morreu, mas esse seu nome é grafado com H, Hemerson. Escrevi há quinze dias sobre a morte do soldado Emerson, morto em um ato de coragem. Esse Hemerson, campograndense, morreu por violência, vandalismo e preconceito contra o estrangeiro na saída de uma boate em Lisboa.

É claro que episódios como esse acontecem com muita freqüência no Brasil, em várias boates de tantas cidades, grandes e pequenas. A combinação de juventude - com certo entusiasmo e audácia que ela traz - bebida e, sobretudo nesse caso, violência, acarreta esses casos em saídas de boates do mundo. Não só do Brasil. Li um caso parecido que aconteceu na Espanha meses atrás, em que um americano foi assassinado na saída da boate em que estava.

O ingrediente a mais que creio é bem marcado nessa história é o preconceito contra o estrangeiro. O estrangeiro sempre foi mal-visto por todos os povos. Desde os gregos antigos – nem falo os de agora, pois só andam pensando neles mesmos – pois está na Ilíada, texto clássico do poeta Homero: o conselho que a deusa Atenas dá a Ulisses é que ande de cabeça baixa e não chame atenção, “pois os moradores daqui não recebem nenhum forasteiro de boa mente, nem dão comida aos que vêm de fora.”

Mesmo nós, brasileiros, que somos mais acolhedores que a maioria, temos preconceitos com o estrangeiro. Ele não precisa ser de outro país, pode ser o vizinho que não aceitamos seu jeito diferente, o índio, o morador do bairro pobre, o homossexual. Enfim, o diferente, que nos ameaça. Segundo Freud, o estranho.

No Mato Grosso do Sul convivemos com fronteiras com dois países e sabemos de episódios de racismos com relação aos bolivianos e aos paraguaios. Digo isso para não atirarmos logo a primeira pedra e dizer que preconceito contra o estrangeiro só os outros têm e que nós somos o povo acolhedor. Não somos, também fazemos os nossos “estrangeiros”, que nos ameaçam.

Não será essa a visão mais evidente e fácil diante de todo imigrante/estrangeiro? Apelar para o preconceito ou para a violência? Mais difícil é se perceber como um qualquer nesse mundo enorme de Deus, com tantas raças, tantas culturas, tantas línguas. Mas para isso o sujeito precisa ter a humildade de se saber um Zé ninguém. Será que os europeus estão preparados para se saberem Zé Ninguém? Quando Freud em “O Mal-estar na civilização” afirma que nenhum homem está à altura do mandamento “Amar o próximo como a ti mesmo”, que o ser humano nunca alcança o suficiente esse mandamento, é isso que ele quer salientar: nosso limite, nossa imperfeição, nossa pobreza.

Mas voltando para esse episódio de preconceito e violência em Lisboa, resultando na morte de um jovem: acredito que o preconceito europeu contra os estrangeiros aumentará nesses tempos de recessão, falta de emprego e dinheiro e queda do euro que eles estão vivendo. Embora o primeiro motivo seja a crise do euro, creio que há uma crise de identidade que assola a Europa. É só assistir o filme francês Les Murs (Os muros), traduzido erroneamente no Brasil por Os muros da escola, quando na verdade os problemas nessa escola francesa, repleta de tantos jovens falando tantas línguas, queria mostrar é a resistência dos professores em aceitar a diversidade cultural que prolifera na Europa atual.

Acredito que esta é uma dificuldade que a Europa só tem vivido nos últimos anos. Zigmunt Bauman escreveu, citando Rougemont que “a Europa descobriu todas as terras do planeta, mas nenhuma delas jamais descobriu a Europa”. E continua em sua tese: ela dominou todos os continentes, mas nunca foi dominada por nenhum deles. Pois este filme mostra exatamente isso: os colonizados foram ao colonizador, assumindo valores que sempre foram apregoados por aqueles – individualismo, busca de sucesso, etc – mas sem abdicar de sua própria cultura.

Esse é o fato novo – maior do que a dificuldade financeira atual, creio eu - que a Europa tem de conviver e não está conseguindo: hoje ela está sendo construída por muitos estrangeiros, que atualmente ela é multicultural, multiracial. E terá outra face no futuro.

Mas voltando a violência contra o Hemerson, o que dizer a essa mãe? Não tenho palavras. Nenhuma! Nem ao menos sei o que é essa dor. Só espero que essa mãe consiga justiça. E que tenha conseguido enterrar seu filho em solo pátrio, pois não vi mais uma notícia de que ela tivesse conseguido os apoios necessários.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Os descendentes

O filme com George Clooney, que assisti ontem lembrou-me muito do Havai, que é o personagem principal. Clooney é coadjuvante. A temática primária é um homem que espera a morte de sua mulher em coma e reaproxima-se das duas filhas. Clooney não está mal no filme, mas não é um grande filme. Nem entendi porque ele está concorrendo ao Oscar por essa atuação. A única grandeza do filme é o paraíso havaiano. Todos os personagens são secundários ao cenário mostrado, suas praias intensamente azuis pela presença das algas, suas areias escuras, vulcânicas; os homens todos com camisetas floridas – e Mat King/Clooney nos conta que não devemos nos enganar: os mais sérios e importantes negócios são feitos com pessoas trajando estas roupas - suas rodovias contornando o recorte do mar, em todas as ilhas; a cadeia de montanhas que ficou mundialmente conhecida, pois aparece no filme “Parque dos Dinossauros”, marca presença duas ou três vezes no filme. A trilha sonora toda na lingua havaiana, essa lingua tão sonora, repleta de vogais que se repetem, pois eles têm poucas consoantes.
A trama se passa em dezenas de cenários desse paraíso - assim é chamado em vários momentos - que está em vias de desaparecer. O pedaço mais inóspito de terra está para ser vendido. Mat King/Clooney vem de uma família em que ele é o descendente do rei (king) Kamehameha I, que casou-se com uma branca e deu origem a uma mistura de raças. Mat King e seus primos – ávidos por vender a valiosa terra – são os descendentes dessa mistura.

Kamehameha I foi o havaiano que unificou todas as ilhas em 1810. Em uma dessas revoltas pela unificação foi morto o Capitão Cook, célebre navegador inglês. Kamehameha é citado várias vezes no filme, suas fotos aparecem na casa do pai de Mat King, quando ele retorna ao domicílio paterno buscando a resposta para o ser ou não ser do filme: vendo ou não vendo?

Mat King é o homem mais conhecido do Estado havaiano, todos que falam com ele sabem da venda a ser feita. É como se ela decidirá o que vai ser feito das memórias: transforma-se em um conglomerado de resorts de luxo ou mantêm-se a memória desse passado recôndito? Pergunta que o personagem de Clooney só vai nos dar a resposta na penúltima cena.

O filme lembrou-me muito uma viagem do passado. Cheguei ao Havai em 9 de setembro de 2003 e senti falta de um paraíso antêntico, dos havaianos que ainda falassem perfeitamente a lingua, do artesanato tipicamente havaiano, da comida tipicamente havaiana. Fui a um centro de cultura dos povos da Polinésia e tudo me pareceu uma Disneylândia. Então entendi perfeitamente o dilema mostrado no filme. Assisti o filme com um misto de saudade desse paraiso de uma natureza belíssima, espetacular, e com uma decepção porque o capitalismo e a globalização, com seus resorts de luxo e objetos de consumo industrializados, destrói tudo, nossa autenticidade, nosso passado, nossa singularidade. Nem o Havai é mais o Havai.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Entrevista com FHC na Revista Bravo

Estou com uma raiva de FHC. Li ontem à noite a entrevista com Fernando Henrique Cardoso que saiu na Bravo desse mês. Acordei com raiva do dito cujo. Reli a entrevista e a raiva continua. A matéria principal da Bravo desse mês é sobre Ruth Cardoso. Está sendo publicada uma coletânea de seus artigos e por isso a revista entrevistou FHC para falar sobre a mulher. Uma das perguntas: por que ela publicou tão pouco? Ele começa respondendo bem, que ela era muito crítica, insegura com o que escrevia e pesquisava e passa a falar dele, de que ela tinha insegurança e ele confiança demais, que os filhos até debochavam disso.

Esse excesso de auto-confiança de FHC todos nós brasileiros conhecemos. Vou pular essa parte.

Nas respostas, ele sempre desliza e passa a falar dele. Ele não sabe o que fazer quando não é o centro de tudo. E minha raiva: ele enfatiza a insegurança dela em dois ou três momentos. E os erros dele - inclusive, ao final, lhe é perguntado sobre o filho que acreditava ser seu e agora o exame de DNA diz que não é - responde suscintamente. Sua lógica é assim: a limitaçao da mulher, boca no trombone; meus erros, boca de siri.

Ainda mais porque a insegurança dela achei uma coisa boa. Uma pesquisadora crítica, que tinha dúvidas, que não sabia se escrevia bem, que titubeava. Os cientistas são assim. Stephen Hawnking, que acabou de fazer 70 anos, falou em entrevista sobre isso, sobre seus erros teóricos, sobre o enigma que são as mulheres para ele, e que ele não tem resposta. Ele disse como uma brincadeira, mas entendi que o mais importante é ter perguntas e estar disposto a pesquisar.

Freud fez uma teoria, refez, no começo errou. Mas FHC não: o homem é certo, inseguros são os outros.

Eu não suporto gente que vive cheia de certezas....