Rainer Maria Rilke
escreveu isso em seus Sonetos a Orfeu.
Depois de passar dez anos esperando escrever algo que não sabia o que era, mas
tomado por uma ideia de algo importantíssimo que teria de ser escrito, e sem conseguir
escrever uma linha, saíram esses sonetos. Li os comentários de um crítico
literário e ele escreveu que Rilke vivia um tempo de aridez criativa. Podemos
chamar de aridez essa impressão que um escritor sente de que tem algo a
escrever, que se prepara para isso, que está submetido a uma ideia que não sabe
bem o que é, que escreve outra coisa e sabe que não é isso¿ É como uma
gestação, vai se encaminhando semana a semana em direção à obra. Uma gestação
literária que demorou dez anos para parir. Que angústia deve ter sentido!
Paciência é tudo, o conselho que ele deu ao jovem poeta se aplicou a ele
também.
E depois escreve esses que
são os mais belos sonetos que já li. Orfeu, o que vive à procura da amada, que
faz por ela todos os esforços e morre em seu fascínio por Eurídice.
Sabemos da paixão que Rilke
declarou por Lou-Andréas Salomé, a russa. Escreveu para ela as palavras mais
lindas que um homem pode escrever a uma mulher. Apaga-me
os olhos: ainda posso ver-te, tranca-me os ouvidos, ainda posso ouvir-te. E
continua para, no fim do poema, afirmar que a traz em seu sangue. E em outro
escreve que o amor de um ser humano por outro é a experiência mais difícil para
cada um de nós, “o mais superior
testemunho de nós próprios, a obra absoluta em face da qual todas as outras são
ensaios”.
Dez anos antes desses Sonetos a Orfeu foi com Salomé à Rússia,
se preparou para essa viagem, aprendeu russo. E não esqueceu nunca a Rússia. Nos
sonetos cita essa viagem “Lembro-me de um
dia de primavera na Rússia\Um cavalo às escuras...”. Uma viagem da qual
nunca esqueceu, um amor russo, uma primavera.