E cheguei a Sevilha, a capital da Andaluzia: quarenta minutos de trem
rápido a partir de Córdoba. É mais aberta para o mundo, com pessoas mais
acolhedoras do que em Córdoba e Granada. Foi essa a minha impressão, pelo
menos. Perguntei a vários sevilhanos porque lá as pessoas eram diferentes; em
situações diversas, disseram-me que mesmo para eles, o povo de Córdoba e
Granada era fechado, que eles, sevilhanos, aceitam mais os estrangeiros, estão
mais acostumados. Creio que a história é mais antiga. É uma cidade de porto,
dali Colombo saiu para descobrir novos mundos. Na Torre de Ouro tem muitos
quadros, de vários séculos, que mostram as pessoas indo à torre à espera de
novos navios que chegavam pelo rio Guadalquivir. A Torre do Ouro é uma
construção mourisca do Século XII, à beira do rio, construída com a função de
vigilância a todas as embarcações que entravam no canal.
A Praça de Espanha é um dos exemplos mais ricos e lindos da arquitetura
andaluza. Só vê-la valeu a viagem. E tem também a Giralda e a Catedral, a terceira
maior do mundo. Somente a vi por fora, pois estava complicado entrar: havia uma
greve de funcionários que estava fechando a maioria das portas. Não me
incomodei de só tirar fotos de fora, pois já soube na primeira manhã em que andei
pelas ruas de Sevilha que teria de voltar. Então, paciência.
Frederico Garcia Lorca, o grande poeta andaluz, escreveu que Sevilha é
uma cidade para se ferir, para sempre se ferir. Mas é uma cidade para viver. E
quanto a Córdoba, diz que é uma cidade para morrer. Escreve isso em mais de um
poema.
Acordava cedo, animada, e enquanto minha amiga ainda dormia, saía para
andar horas pelas ruas estreitas do centro antigo. A cidade que mais gostei de
visitar na Andaluzia, sem sombra de dúvida. Comprei um xale flamenco de seda
pura, verde, de tanto verde que é quase fosforescente, bordado com imensas
rosas brancas. São caríssimos, mas em um minuto de loucura, comprei. Usei-o
poucas vezes, mas segue sendo meu amuleto dessa viagem inesquecível. E não só isso, trouxe de Sevilha a maior parte
das lembranças de viagem: duas reproduções da Torre do Ouro, que estão
penduradas em minha sala; uma miniatura da torre está em meu consultório, e
também uma estatueta de uma dançarina flamenca. Tudo, com um bocado de
sacrifício, chegou inteiro.
Nasceu em Sevilha um mito que correu mundo, saiu de lá - houve tentativas
de saber quem seria o sujeito que deu corpo ao mito, mas nunca se conseguiram
os dados históricos – o maior amante de todos os tempos, Don Juan, o Sedutor de
Sevilha, que conquistava todas as mulheres e amava a cada uma delas como se
fosse a única. O personagem foi criado pelo frade espanhol Tirso de Molina,
porém baseado em lendas que já se espalhavam pela cidade. Depois de Sevilha,
ela correu mundo pelas letras de muitos escritores. Mas deve ter deixado marcas
na cidade, em que seus homens precisam ser muito galantes. Era eu pedir um
endereço e o prestativo senhor me levava até onde eu queria, começava a chover
e outro me oferecia um canto de seu guarda-chuva até eu chegar ao hotel. Um senhor a quem eu e Alba pedimos informação
sobre a melhor parada para chegar ao nosso hotel, desceu do ônibus conosco e
fez questão de levar-nos até a porta do hotel. E assim eram as informações que
pedíamos a todos esses sevilhanos donjuanescos.
Sevilha ainda espera meu retorno, com seu passado presente, seus azulejos
coloridos, seus Dons Juans. E, claro, com os poemas imortalizados de Garcia
Lorca: Sevilha, de longos ritmos e labiríntica, uma cidade para se viver. E
morrer de amor. Por ela, também.
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