Arturo Cova é
um homem que não se tornou o que poderia ter sido, descendia do infortúnio e o
destino implacável lhe retirou a prosperidade, empurrou-o para os pampas.
Começa sua estória nos contando que antes nunca foi apaixonado por mulher
alguma, “jogou seu coração ao acaso e ganhou a violência”. Nada soube das
“delícias embriagadoras, da confidência sentimental”, mas ambicionava “o dom
divino de um amor ideal” que incendiaria sua alma e seu corpo como a chama na
madeira. E eis que ele conhece Alícia.
“Quando os
olhos de Alícia me trouxeram a desventura, havia já renunciado a esperança de
sentir um afeto puro. Em vão meus braços – tediosos de liberdade – se
estenderam para muitas mulheres, implorando por elas, sucessivamente. Ninguém
adivinhava meu sonho. E seguia em silencio meu coração.”
Alícia chegou
até ele fugindo de um casamento arranjado por sua família. E amava um primo com
quem também não poderia ficar. E se entregou a Arturo facilmente: “se entregou
sem vacilações, esperançada no amor que buscava em mim”. Depois ele continuou querendo-a. Ela lhe
respondeu: morrerei sozinha, minha desgraça se opõe a seu porvir. Mesmo assim,
fugiu com ele para a floresta amazônica colombiana, para a vida dura dos
colonos e indígenas escravizados pela febre da borracha.
Mesmo vivendo
dia-a-dia com Alícia, olhava e seduzia as outras mulheres que iam aparecendo
pelo caminho, seguindo sua vida de homem de coração endurecido, que compensa em
fidalguia o que não pode dar em ternura, com a convicção íntima de que vive
como enamorado sem o estar, e de que “essa idiossincrasia cavalheiresca o
empurrará até o sacrifício” por uma dama que não é a dele, e por um amor que
não conhece.
“A fama de
galã ganhou no ânimo de muitas mulheres, graças ao costume de fingir, para que
minha alma se sinta menos sozinha. Por toda parte fui buscando no que distrair
minha inconformidade, e ia de boa fé, desejoso de renovar minha vida e me resgatar
da perversão; porém em qualquer lugar onde pus minha esperança me encontrei
lamentavelmente vazio, embelezado pela fantasia e repudiado pelo desencanto. E
assim, enganando-me com minha própria verdade, consegui conhecer todas as
paixões e sofro o fastio, e sigo desorientado, caricaturando o ideal para
sugestionar-me com o pensamento de que estou próximo da redenção. A quimera que
persigo é humana, e bem sei que dela partem os caminhos para o triunfo, para o
bem-estar e para o amor. Mas se passaram os dias e se foi consumindo minha
juventude sem que minha ilusão reconhecesse a derrota; e vivendo entre mulheres
sensíveis, não encontrei a sensibilidade, nem entre as enamoradas, o amor, nem
a fé entre as crentes. Meu coração é como uma rocha coberta de musgo, donde
nunca falta uma lágrima. Hoje me viu chorar, não por fraqueza de ânimo, que
bastante rancor o tenho na vida; chorei por minhas aspirações enganadas, por
meus sonhos desvanecidos, pelo que não fui, pelo que jamais serei.”
E tudo isso
só até a metade do livro. Continuo avidamente a segunda parte, que não pode
descumprir a promessa dessa escrita formidável. La Vorágine é a única novela de
José Eustasio Rivera e, também, uma obra clássica da literatura colombiana do
começo do Século XX. Trouxe também, de minha viagem a Colômbia, em julho, seu
livro de poesias Tierra de Promisíon y
otros poemas. Em abril de 1928, voltando de Cuba, enviado para um congresso
internacional sobre imigração, parou em Nova York, famoso como poeta,
novelista, político e diplomata, sentiu-se mal, foi internado e morreu do que
pareceu ser uma recidiva de malária.
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