domingo, 9 de outubro de 2011

Todo o mundo

Escrevendo um livro - ou qualquer coisa parecida, talvez um conto, ou só um pequeno texto. Ainda não sei - sobre minhas viagens.
Eis um trecho abaixo......


“Batendo pernas/correr mundo afora/ Vitrine do mundo/ lugares à mão”. Assim começa a letra da música Coração de todo mundo, de Oswaldo Montenegro e Raimundo Costa. Escutei esta música pela primeira vez no disco ainda de vinil, na casa de C.. E gostei tanto que, naquele momento, ele me deu seu disco. Esse forasteiro, em minha vida e na cidade, já gostava mais de Montenegro do que eu. Pelo menos até eu ter escutado esta música pela primeira vez.


À época ainda não tinha corrido o mundo, não conhecia as jóias de Itália, os mares de Espanha, os becos escuros da velha Paris. O mundo para mim era menor, mais familiar. Mais de duas décadas se passaram, fiz muitas viagens, estudei algumas línguas e conversei com pessoas. Fiz amigos em terras longínquas e aprendi que o mais importante em uma viagem são as pessoas que conhecemos, o que conhecemos sobre suas histórias. As pessoas e a história fazem um país.

Nessa música, Coração de todo mundo, que escutei pela primeira vez na casa desse homem, encontrei um desejo que determinou meus caminhos. E encontrei-me com a estrangeira que era para mim mesma. C. apresentou-me isso e também me apresentou essa música.

Agora, mais de vinte anos depois, conto histórias que vivi em lugares distantes de casa. Mais, ainda: fiz do mundo minha casa e fui estrangeira em todos os lugares.

Perdi-me em ruelas do Complexo do Castelo, na Cidade Velha, em Praga; visitei Campos de Concentração; levantei de madrugada, andando pelas ruas de Granada para comprar ingressos para entrar em Alhambra; amei a Cracóvia e sua gente. Odiei Viena e sua gente. Quase apanhei de uma velhinha alemã que achou que seu marido queria me seguir. Em Sevilha comprei tantos souvenirs. Guardo fotografias, desenhos antigos e reproduções da Torre do Ouro pela casa. Tudo para trazer um pouco da cidade comigo, cidade amada de Garcia Lorca, que também trago até hoje em meu coração. Entre Gand e Bruxelas, passei uma primavera. Nela, na passagem de um dia para outro, foram se esvaindo alguns dos dias mais felizes de minha vida. E amei Paris à primeira vista. E a segunda também. E toda vez. Cada vez mais.

Todo o mundo é o que o artista consegue alcançar. Uma bela música que vai da Itália a Xangai, dos mares de Espanha a Paris e a todo lugar. Só um poeta pode cobrir esse infindável território e colocá-lo na palma de sua mão. Para uma viajante, todo o mundo é uma ilusão, pois a cada passo que dá o mundo fica maior, as distâncias maiores e os lugares a conhecer infindáveis. Só pela poesia conhecer todo o mundo é possível, mas mantenho para este livro este título ambicioso, para marcar a ilusão da viajante que espera encontrar um lugar, estrangeiro e familiar onde possa viver. Enquanto esse lugar não chega – se ele chegar - mantêm-se em sua condição errática.

Um comentário:

  1. hum..gostei do texto, amei a idéia. Se você escrever esses textos de viagem aqui no blog serei leitora assídua.
    Agora que comecei a rodar o mundo, será muito bom ter por companhia seus relatos...
    bjs

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